INFLUÊNCIA DO ESPÍRITO DO MÉDIUM
SISTEMA DOS MÉDIUNS INERTES
APTIDÃO DE CERTOS MÉDIUNS PARA LÍNGUAS, MÚSICA, DESENHOS, ETC.
DISSERTAÇÃO DE UM ESPÍRITO SOBRE O PAPEL DOS MÉDIUNS
223. 1. No momento em que exerce a sua faculdade o médium se acha em estado perfeitamente normal?
— Às vezes se acha num estado de crise mais ou menos definido. É isso que o fadiga e é por isso que necessita de repouso. Mas, na maioria das vezes, seu estado não difere muito do normal, sobretudo nos médiuns escreventes.
— A alma do médium pode comunicar-se como qualquer outra. Se ela goza de um certo grau de liberdade, recobra então as suas qualidades de Espírito. Tens a prova na visita das almas de pessoas vivas que se comunicam contigo, muitas vezes sem serem chamadas. Porque é bom saber que entre os Espíritos que evocas há os que estão encarnados na Terra. Nesses casos eles te falam como Espíritos e não como homens. Por que o médium não poderia fazer o mesmo?(1)
2. a . Esta explicação não parece confirmar a opinião dos que acreditam que todas as comunicações são do Espírito do médium e não de outro Espírito?
— Eles só estão errados por entenderem que tudo é assim: Porque é certo que o Espírito do médium pode agir por si, mas isso não é razão para que outros Espíritos não pudessem agir também por seu intermédio.(2)
3. Como distinguir se o Espírito que responde é o médium ou se é outro Espírito?
— Pela natureza das comunicações. Estuda as circunstâncias e a linguagem e distinguirás. É sobretudo no estado sonambúlico ou de êxtase que o Espírito do médium se manifesta, pois então se acha mais livre. No estado normal é mais difícil. Há resposta, aliás, que não lhe podem ser atribuídas. Por isso é que te digo para observar e estudar.
Observação de Kardec: Quando uma pessoa nos fala, facilmente distinguimos o que é dela e o de que ela apenas se faz eco. Acontece o mesmo com os médiuns.
4. Desde que o Espírito do médium pôde adquirir,em existências anteriores, conhecimentos que esqueceu no seu corpo atual, mas dos quais se lembra como Espírito, não o pode tirar do fundo de si mesmo as idéias que parecem ultrapassar o alcance de sua instrução?
— Isso acontece muitas vezes nos casos de crise sonambúlica ou extática, mas ainda assim existem circunstâncias que não permitem a dúvida: estuda longamente e medita.
5. As comunicações do Espírito do médium são sempre inferiores às que pudessem ser dadas por outros Espíritos?
— Sempre, não, pois o Espírito comunicante pode ser de uma ordem inferior à do médium e nesse caso falará com menos sensatez. Vê-se isso no sonambulismo, pois sendo o Espírito do sonâmbulo o que freqüentemente se manifesta, no entanto diz algumas vezes coisas muito boas.
6. O Espírito comunicante transmite diretamente o seu pensamento ou tem como intermediário o Espírito do médium?
— O Espírito do médium é o intérprete, porque está ligado ao corpo que serve para a comunicação e porque é necessária essa cadeia entre vós e os Espíritos comunicantes, como é necessário um fio elétrico para transmitir uma notícia à distância, e na ponta do fio uma pessoa inteligente que a receba e comunique.(3)
7. O Espírito do médium influi nas comunicações de outros Espíritos que ele deve transmitir?
— Sim, pois se não há afinidade entre eles, o Espírito do médium pode alterar as respostas, adaptando-as às suas próprias idéias e às suas tendências. Mas não exerce influência sobre os Espíritos comunicantes. É apenas um mau intérprete.
8. É essa a causa da preferência dos Espíritos por certos médiuns?
— Não existe outro motivo.Procuram o intérprete que melhor simpatize com eles e transmita com maior exatidão o seu pensamento. Se houver simpatia entre eles, o Espírito do médium será um antagonista que lhe oferecerá resistência, tornando-se um intérprete de má vontade e quase sempre infiel. Acontece o mesmo entre vós, quando as idéias de um sábio são transmitidas por um insensato ou uma pessoa de má fé.
9. Concebe-se que seja assim para os médiuns intuitivos, mas quando se trata de médiuns mecânicos?
— Não compreendestes bem a função do médium. Há uma lei que ainda te escapa. Lembra-te de que, para produzir o movimento de um corpo inerte o Espírito necessita do fluido animalizado do médium, de que se serve, por exemplo, para animar momentaneamente a mesa, fazendo-a obedecer à sua vontade. Pois bem, para uma comunicação inteligente ele necessita também de um intérprete inteligente, e esse intermediário é o Espírito do médium.
9 . a . Isto não parece aplicar-se às mesas falantes, pois quando estas e outros objetos inertes, como as pranchetas e as cestas, respondem de maneira inteligente, parece que o Espírito do médium não tem nenhuma participação?
— É um engano. O Espírito pode dar uma vida factícia momentânea a um corpo inerte, mas não a inteligência. Jamais um corpo inerte teve inteligência. É pois o Espírito do médium que recebe o pensamento sem o perceber e o transmite pouco a pouco, com a ajuda de diversos intermediários.(4)
10. Parece resultar dessas explicações que o Espírito do médium não é jamais completamente passivo?
— Ele é passivo quando não mistura suas próprias idéias com as do Espírito comunicante, mas nunca se anula por completo. Seu concurso é indispensável como intermediário, mesmo quando se trata dos chamados médiuns mecânicos.(5)
11. Não há maior garantia de independência no médium mecânico do que no médium intuitivo?
— Sem dúvida, e para algumas comunicações é preferível o médium mecânico. Mas, quando conhecemos as faculdades de um médium intuitivo, isso se torna indiferente, segundo as circunstâncias. Quero dizer que certas comunicações exigem menos precisão.
12. Entre os diferentes sistemas propostos para explicar os fenômenos espíritas há um que pretende estar a verdadeira mediunidade nos corpos inertes, por exemplo, na cesta ou na caixa de papelão que serve de instrumento. O Espírito comunicante se identificaria com o objeto e o tornaria não somente vivo, mas também inteligente, do que resulta a designação de médiuns inertes para os objetos. Que pensas disso?
— Só se tem a dizer o seguinte: se o Espírito transmitisse inteligência à caixa e lhe desse vida, ela escreveria sozinha, sem o concurso do médium. Seria estranho que o homem inteligente virasse máquina e um objeto inerte se tornasse inteligente. É um dos numerosos sistemas surgidos de idéias preconcebidas e que vão caindo diante da experiência e da observação.
13. Um fenômeno bem conhecido poderia tornar admissível a idéia de existir, os corpos inertes assim animados, mais do que a vida e até mesmo do que a inteligência. É o das mesas, cestas etc., que exprimem, nos seus movimentos, a cólera ou a afeição?
— Quando um homem colérico sacode uma bengala não é esta que se acha encolerizada, nem mesmo a mão que a segura, mas o pensamento que dirige a mão. As mesas e as cestas não são mais inteligentes do que a bengala. Não têm nenhum sentimento inteligente, mas obedecem a uma inteligência. Numa palavra: não é o Espírito que se transforma em cesta, nem mesmo escolhe a cesta para nela se abrigar.
14. Se não é racional atribuir inteligência a esses objetos, pode-se considerá-los como uma variedade de médiuns, designando-o por médiuns inertes?
— É uma questão de palavras que pouco nos importa, desde que vos entendais. Sois livres de chamar homens a um fantoche.(6)
15. Os Espíritos só têm a linguagem do pensamento, não a articulada, e portanto usam apenas uma língua. Assim, um Espírito poderia exprimir-se por via mediúnica numa língua que nunca falara quando vivo. Nesse caso, de onde tira as palavras que emprega?
— Já respondeste a pergunta por ti mesmo, ao dizer que os Espíritos só tem uma língua, que é a do pensamento. Todos compreendem essa língua, tanto os homens como os Espíritos. Ao dirigir-se ao Espírito encarnado do médium, o Espírito errante não fala em francês nem em inglês, mas na língua universal do pensamento. Para traduzir as suas idéias numa linguagem articulada, transmissível, e ele utiliza as palavras do vocabulário do médium.
16. Se for assim, o Espírito só deveria exprimir-se na língua do médium, mas sabe-se que escreve em línguas que lhe são desconhecidas. Não há nisso uma contradição?
— Observe-se primeiro que nem todos os médiuns são igualmente aptos a esse gênero do exercício. Em seguida, que os Espíritos só se prestam a ele acidentalmente, quando julgam que isso pode ser útil. Para as comunicações usuais, de certa extensão, preferem servir-se de uma língua familiar ao médium, que lhes apresenta menos dificuldades materiais a superar.
17. A aptidão de certos médiuns para escreverem numa língua estranha não provém do fato de a terem usado noutra existência, conservando-a na atual em forma intuitiva?
— Certamente isso pode acontecer, mas não é uma regra. O Espírito pode, com algum esforço, superar momentaneamente a resistência material. É o que se verifica quando o médium escreve, na sua própria língua que não conhece.(7)
18. Uma pessoa que não sabe escrever, poderia fazê-lo como médium?
— Sim, mas compreende-se que haverá grande dificuldade mecânica a vencer, pois a mão não está habituada aos movimentos necessários para formar as letras. Acontece o mesmo com os médiuns desenhistas que não sabem desenhar.
19. Um médium de inteligência bem reduzida poderia transmitir comunicações de ordem elevada?
— Sim, pela mesma razão que um médium pode escrever numa língua que não conhece. A mediunidade propriamente dita independe da inteligência, como das qualidades morais. Na falta de melhor instrumento o Espírito pode servir-se do que tem à mão. Mas é natural que, para as comunicações de certa ordem, prefira o médium que lhe oferece menos obstáculos materiais. E há ainda outra consideração: o idiota freqüentemente só é idiota pela imperfeição dos seus órgãos, pois o seu Espírito pode ser mais adiantado do que se pensa. Tens a prova disso por algumas evocações de idiotas mortos ou vivos.(8)
Observação de Kardec: Este é um fato comprovado pela experiência. Numerosas vezes evocamos Espíritos de idiotas vivos, que deram provas patentes de sua identidade, respondendo-nos de maneira muito sensata e até mesmo superior. Esse estado é uma punição para o Espírito, que sofre com o constrangimento em que se encontra. Um médium idiota pode oferecer, pois, algumas vezes, ao Espírito que deseja manifestar-se, maiores recursos do que se pensa. (Ver Revista Espírita de julho de 1860, artigo sobre Frenologia e Fisiognomia.)
20.Como se explica à aptidão de certos médiuns para escrever em versos, apesar de sua ignorância em matéria de poesia?
— A poesia é uma linguagem. Eles podem escrever em versos como podem fazê-lo numa língua que desconhecem. Além disso podem ter sido poetas em outra existência. Como já disse, os conhecimentos adquiridos nunca se perdem para o Espírito, que deve atingir a perfeição em todas as coisas. Assim, o que eles souberam no passado lhes dá, sem que o percebam, uma facilidade que não possuem no estado habitual.
21.É o mesmo caso dos que têm aptidão especial para o desenho e a música?
— Sim. O desenho e a música são também forma de expressão do pensamento. Os Espíritos se servem dos instrumentos que lhes oferecem mais facilidades.
22. A expressão do pensamento pela poesia, o desenho ou a música depende unicamente da aptidão do médium ou também do Espírito comunicante?
— Algumas vezes do médium, outras do Espírito. Os Espíritos superiores possuem todas as aptidões, os Espíritos inferiores têm conhecimentos limitados.
23. Por que motivo um homem dotado de grande talento numa existência não o possui na seguinte?
— Não é sempre assim, pois muitas vezes ele aperfeiçoa numa existência o que começou na anterior. Mas pode acontecer que uma faculdade superior adormeça durante certo tempo para facilitar o desenvolvimento de outra. Será um germe latente que mais tarde germinará de novo, mas do qual sempre haverá alguns sinais ou pelo menos uma vaga intuição.
224. O Espírito comunicante compreende todas as línguas, sem dúvida, pois as línguas são formas de expressão do pensamento e o Espírito compreende pelo pensamento. Mas, para transmitir esse pensamento, necessita de um instrumento: esse instrumento é o médium. A alma do médium que recebe a comunicação do Espírito, só pode transmiti-la através dos órgãos corporais. Ora, esses órgãos não podem ter, para a transmissão de uma língua desconhecida, a flexibilidade que possuem para a língua familiar.
Um médium que só saiba falar o francês poderá, acidentalmente, dar uma resposta em inglês, se o Espírito o quiser. Mas os Espíritos, que acham a linguagem humana já por si muito lenta, em relação à rapidez do pensamento, — pois procuram abreviá-la o quanto podem, — impacientam-se com a resistência mecânica da transmissão e por isso nem sempre o fazem. Essa também a razão por que um médium novato, que escreve penosa e lentamente na sua própria língua, em geral só obtém respostas breves, sem o necessário desenvolvimento. Por isso também os Espíritos recomendam que só perguntas simples sejam feitas por seu intermédio. Para as perguntas de maior alcance é necessário um médium desenvolvido, que não oferece nenhuma dificuldade mecânica ao Espírito.
Não escolheríamos para ler um texto um aluno que apenas soletra. Um bom operário não gosta de servir-se de maus instrumentos. Acrescentemos outra consideração de grande importância no tocante às línguas estrangeiras. Os ensaios nesse sentido são sempre feitos por curiosidade com o objetivo de experimentação. Ora, nada mais antipático aos Espíritos do que as provas a que tentam submetê-los. Os Espíritos superiores nunca se prestam a isso. Afastam-se quando se pretende entrar nesse caminho. Tanto gostam dos assuntos sérios e úteis, quanto lhes repugna ocupar-se de futilidades e simples curiosidade. Os incrédulos dirão que sendo para convencê-los trata-se de coisa séria, pois poderá resultar na conquista de adeptos para a causa dos Espíritos. A isso respondem os Espíritos. “Nossa causa não precisa dos que são bastante orgulhosos para se julgarem indispensáveis. Chamamos para nós aqueles que queremos, e que são sempre os mais humildes e pequenos. Jesus fez acaso os milagres que os escribas lhe pediam?”.
E de que homens se serviram para revolucionar o mundo? Se quiserdes convencer-vos, tendes outros meios que não as exigências. Começai por sujeitar-vos aos fatos: não é normal que o aluno imponha sua vontade ao mestre.(9)
Disso resulta que, salvo algumas poucas exceções,o médium transmite o pensamento dos Espíritos pelos meios mecânicos de que dispõe, e a expressão desse pensamento pode e deve, o mais freqüentemente, ressentir-se da imperfeição desses meios. Assim, o homem inculto, o camponês, poderá dizer as mais belas coisas exprimir os mais elevados pensamentos, os mais filosóficos, falando como camponês, pois, como se sabe, para os Espíritos o pensamento está acima de tudo.
Isto responde às objeções de certos críticos quanto às incorreções de linguagem e de ortografia que se podem atribuir aos Espíritos, e que tanto podem ser deles quanto dos médiuns. É uma futilidade apegar-se a essas coisas. E não é menos pueril querer reproduzir essas incorreções com minuciosa exatidão, como vimos fazerem algumas vezes. Podemos corrigi-las sem nenhum escrúpulo, a menos que sejam características do Espírito, caso em que seria útil conservá-las como prova de identidade. Assim, por exemplo, vimos um Espírito escrever constantemente Jule (sem o s) referindo-se ao neto, porque, quando vivo, escrevia assim, embora o neto, que servia de médium, soubesse perfeitamente escrever o seu nome.(10)
225. A seguinte dissertação, dada espontaneamente por um Espírito superior que se revelou por comunicações bastante elevadas, resume da maneira mais clara e completa a questão do papel do médium:
“Qualquer que seja a natureza dos médiuns escreventes, mecânicos, semimecânicos ou simplesmente intuitivos, nossos processos de comunicação por meio deles não variam na essência. Com efeito, nossas comunicações com os Espíritos encarnados, diretamente, ou com os Espíritos propriamente ditos, se realizam unicamente pela irradiação do nosso pensamento”.
Nossos pensamentos não necessitam da vestes da palavra para que os Espíritos os compreendam. Todos os Espíritos percebem o pensamento que desejamos transmitir-lhes, pelo simples fato de o dirigirmos a ele, e isso na razão do grau de suas faculdades intelectuais. Quer dizer que determinado pensamento pode ser compreendido por estes e aqueles, segundo o respectivo adiantamento, enquanto para outros o mesmo pensamento, não despertando nenhuma lembrança, nenhum conhecimento no fundo do seu coração ou do seu cérebro, não é perceptível. Nesse caso, o Espírito encarnado que nos serve de médium é mais apropriado para transmitir o nosso pensamento a outros encarnados, embora não o compreenda, o que um Espírito desencarnado mas pouco adiantado não poderia fazer, se fôssemos obrigados à sua mediação. Porque o ser terreno põe o seu corpo, como instrumento, à nossa disposição, o que o Espírito errante não pode fazer.
Assim, quando encontramos num médium o cérebro cheio de conhecimentos adquiridos na sua vida atual,e o seu Espírito rico de conhecimentos anteriores, latentes, próprios a facilitar as nossas comunicações, preferem servir-nos dele, porque então o fenômeno da comunicação nos será muito mais fácil do que através de um médium de inteligência limitada, e cujos conhecimentos anteriores fossem insuficientes. Vamos nos fazer compreender por meio de algumas explicações claras e precisas.
Com um médium cuja inteligência atual ou anterior esteja desenvolvida, nosso pensamento se comunica instantaneamente, de Espírito a Espírito, graças a uma faculdade peculiar à essência mesma do Espírito. Nesse caso encontramos no cérebro do médium os elementos apropriados à roupagem de palavras correspondentes a esse pensamento, quer o médium seja intuitivo, semimecânico ou mecânico. É por isso que apesar de diversos Espíritos se comunicarem através do médium, os ditados por eles recebidos trazem sempre o cunho pessoal do médium, quanto à forma e ao estilo. Porque embora o pensamento não seja absolutamente dele, o assunto não se enquadre em suas preocupações habituais, o que desejamos dizer não provenha dele de maneira alguma, ele não deixa de exercer sua influência na forma, dando-lhe as qualidades e propriedades características da sua individualidade. É precisamente como quando olhamos diversos lugares através de binóculos coloridos, de lentes brancas, verdes ou azuis, e embora os lugares e objetos vistos pertençam ao mesmo trecho mas tenham aspectos inteiramente diferentes, aparecem sempre com a coloração dada pelas lentes.
Melhor ainda: comparemos os médiuns a esses botijões de vidros com líquidos coloridos e transparentes que se vêem nos laboratórios farmacêuticos. Pois bem, nós somos como focos luminosos voltados para certos trechos de paisagens morais, filosóficas, iluminando-os através de médiuns azuis, verdes ou vermelhos, de maneira que os nossos raios luminosos tomam essas colorações. Ou seja, obrigados a atravessar vidros mais ou menos bem lapidados, mais ou menos transparentes, o que vale dizer médiuns mais ou menos apropriados, esses raios só atingem os objetos que desejamos iluminar tomando a coloração ou a forma própria e particular desses médiuns.
Enfim, para terminar com mais uma comparação: nós, os Espíritos, somos como os compositores de música que tendo composto ou querendo improvisar uma ária só dispõem de um destes instrumentos; um piano, um violino, uma flauta, um fagote ou um apito comum. Não há dúvida que com o piano, com a flauta ou com o violino executaremos a ária de maneira satisfatória. Embora os sons do piano, do fagote ou da flauta sejam essencialmente diferentes entre si, nossa composição será sempre a mesma nas diversas variações de sons. Mas se dispomos apenas de um apito comum ou mesmo de um sifão de esguicho, eis-nos em dificuldade.
Quando somos obrigados a servir-nos de médiuns pouco adiantados nossos trabalho se torna mais demorado e penoso, pois temos de recorrer a formas imperfeitas de expressão, o que é para nós um embaraço. Somos então forçados a decompor os nossos pensamentos e ditar palavra por palavra, letra por letra, o que nos é fatigante e aborrecido, constituindo verdadeiro entrave a prestezas e ao bom desenvolvimento de nossas manifestações.
É por isso que nos sentimos felizes ao encontrar médiuns bem apropriados, suficientemente aparelhados, munidos de elementos mentais que podem ser prontamente utilizados, bons instrumentos numa palavra, porque então o nosso perispírito, agindo sobre o perispírito daquele que mediunizamos, só tem de lhe impulsionar a mão que serve de porta-caneta ou porta-lápis. Com os médiuns mal aparelhados somos obrigados a realizar um trabalho semelhante ao que temos para comunicar-nos por meio de pancadas, ou seja indicando letra por letra, palavra por palavra, para formar as frases que traduzem o pensamento a transmitir. Essa a razão de nossa preferência pelas classes esclarecidas e instruídas, para a divulgação do Espiritismo e o desenvolvimento da mediunidade escreventes, embora seja nessas classes que se encontram o indivíduo mais incrédulo, mais, rebelde e mais destituído de moralidade. E é também por isso que, se hoje deixamos aos Espíritos brincalhões e pouco adiantados a transmissão das comunicações tangíveis por meio de pancadas e os fenômenos de transporte, também entre vós os homens pouco sérios preferem os fenômenos que lhes tocam os olhos e os ouvidos aos de natureza puramente espiritual, puramente psicológica.
Quando queremos ditar mensagens espontâneas agimos sobre o cérebro, nos arquivos do médium, e juntamos o nosso material com os elementos que ele nos fornece. E tudo isso sem que ele o perceba. É como se tirássemos da bolsa do médium o seu dinheiro e dispuséssemos as moedas, para somá-las. Na ordem que nos parecesse melhor.(11)
Mas quando o próprio médium quer interrogar-nos, seja por que meio for, seria bom que refletisse seriamente a fim de nos fazer as perguntas de maneira metódica, facilitando-nos assim o trabalho de responder. Porque, segundo já foi dito em anterior instrução, vosso cérebro está freqüentemente numa desordem inextricável, sendo para nós tão difícil quanto penoso mover-nos no dédalo dos vossos pensamentos.
Quando as perguntas devem ser feitas por terceiro, é bom e conveniente que sejam antes comunicadas ao médium para que ele se identifique com o Espírito do interrogante, impregnando-se, por assim dizer, das suas intenções. Porque então nós mesmos teremos muito mais facilidades para responder, graças à afinidade existente entre o nosso perispírito e o do médium que nos serve de intérprete.(12)
Podemos, certamente, tratar de Matemáticas através de um médium que as desconheça por completo, mas quase sempre o Espírito do médium possui esse conhecimento em estado latente. Isso quer dizer que se trata de um conhecimento pessoal do ser fluídico e não do ser encarnado, porque o seu corpo atual é um instrumento inadequado ou rebelde a essa forma de conhecimento.
O mesmo se dá com a Astronomia, a Poesia, a Medicina e as línguas diversas, e ainda com todos os demais conhecimentos peculiares à espécie humana. Por fim, temos ainda o meio penoso de elaboração, aplicado aos médiuns completamente estranhos ao assunto tratado, que é o de reunião das letras e das palavras como se faz em tipografia.(13)
Como já dissemos, os Espíritos não têm necessidades de vestir os seus pensamentos com palavras. Eles o percebem e os transmitem entre si. Os seres encarnados pelo contrário, só podem comunicar-se pelo pensamento traduzido em palavras. Enquanto a letra, a palavra, o substantivo, o verbo, a frase, enfim, vos são necessários para percepção, mesmo mental, nenhuma forma visível ou tangível é necessária para nós. – ERASTO e TIMÓTEO.(14)
Observação de Kardec: Esta análise do papel dos médiuns e dos processos pelos quais se comunicam é tão clara quanto lógica. Dela decorre o princípio de que o Espírito não se serve das idéias do médium, mas dos materiais necessários para exprimir os seus próprios pensamentos, existentes no cérebro do médium, e de que, quanto mais rico for o cérebro, mais fácil se torna à comunicação.
Quando o Espírito se exprime numa língua familiar ao médium, encontra as palavras já formadas e prontas para traduzir a sua idéia. Se o faz numa língua estrangeira, não dispõe das palavras, mas apenas das letras. É então que o Espírito se vê obrigado a ditar, por assim dizer, letra por letra, exatamente como se quiséssemos fazer escrever em alemão uma pessoa que nada soubesse dessa língua.
Se o médium não souber ler nem escrever, não dispõe nem mesmo das letras em seu cérebro. É então necessário que o Espírito lhe conduza a mão, como se faria a uma criança. Nesse caso há uma dificuldade material ainda maior a ser vencida.
Esses fenômenos são possíveis. Temos deles numerosos exemplos. Mas compreende-se que essa maneira de proceder não corresponde à necessidade de extensão e rapidez das comunicações, e que os Espíritos devem preferir os instrumentos mais rápidos, ou, como eles mesmos dizem, os médiuns bem aparelhados, segundo o entendem.
Se os que pedem esses fenômenos para se convencerem, tratassem antes de estudar a teoria, ficariam sabendo em que condições especiais eles se produzem.(15)
(1) Ver as evocações de Espíritos de vivos na Revista Espírita, feita por Kardec para pesquisas. Mas o Espírito aqui se refere a evocações de Espíritos já reencarnados, sem que Kardec o soubesse. (N. do T.)
(2) Esse erro de exclusivismo é o mesmo que hoje praticam os parapsicólogos antiespíritas, que pensam haver descoberto a pólvora ao afirmar: “Não há Espíritos,pois tudo vem da mente do médium!”. O Espiritismo, como se vê, conhece desde o seu início os dois fenômenos: o anímico, de manifestação da alma do médium, e o espírita, de manifestação de um Espírito desencarnado. Jamais o Espiritismo cometeu o erro do exclusivismo oposto, ou seja, de afirmar que as comunicações são apenas de Espíritos desencarnados. Veja-se a Revista Espírita, o livro de Aksakoff Animismo e Espiritismo e os livros de Ernesto Bozzano Animismo ou Espiritismo e Comunicações Mediúnicas Entre Vivos. (N. do T.)
(3) O papel do médium nas comunicações é sempre ativo. Seja o médium consciente ou inconsciente, intuitivo ou mecânico, dele sempre depende a transmissão e sua pureza. Essa condição explicaria muitas dificuldades que os observadores apressados atribuem a intuitos de mistificação, caso tivessem a prudência científica necessária para uma análise mais profunda do problema mediúnico. A mediunidade, como se vê, é mais complexa e sutil do que o supõem os críticos e negadores sistemáticos. (N. do T.)
(4) A expressão francesa a son insu tem sido traduzida nesta passagem por a seu mal grado, o que não está certo. O Espírito do médium recebe o pensamento e o transmite pelos diversos intermediários ou instrumentos (mesa, cesta, etc.) sem perceber exatamente o que faz sob o impulso do comunicante, mas não contra a vontade. (N. do T.)
(5) A passividade do médium é assim uma concordância, determinada pela sua própria vontade. Ele nunca se anula,mas serve de boa vontade ao Espírito comunicante. (N. do T.)
(6) A insistência de Kardec nessas perguntas era motivada pela campanha que um inovador desenvolvia em Paris, acusando-o de não conhecer a existência dos médiuns inertes,que ele recusava. Ver o episódio na Revista Espírita. (N. do T.)
(7) O caso Chico Xavier é a mais eloqüente demonstração atual desse princípio. O médium tem recebido livros inteiros em linguagem técnica sobre Medicina, Sociologia, História e outros assuntos, sem nenhum conhecimento pessoal dessas matérias. Vejam-se, como exemplos, Emmanuel e Evolução Em Dois Mundos. (N. do T.)
(8) As pesquisas parapsicológicas vêm confirmando plenamente essa tese espírita sobre os idiotas, como se constata nas experiências com débeis mentais, tão bem dotados,como os sensitivos normais, das chamadas funções psi. Vejam-se os estudos de Jean Ehenwald, Eisenbud, Urban, Humphrey, Schmeidler e outros a respeito. (N. do T.)
(9) Os incrédulos pensam sempre em termos de proselitismo, de acordo com os hábitos da vida terrena. Os Espíritos, entretanto, não se interessam pelo número de adeptos e sim pela qualidade moral destes. Se o incrédulo não tem condições de maturidade moral, só aceitando a realidade dos fatos segundo os seus caprichos pessoais, por mais inteligente, culto ou importante que seja, de nada valerá a sua adesão para os Espíritos, pois em nada poderá auxiliá-los no alenvantamento moral da Humanidade. Esta é uma das questões mais difíceis de se compreender, no tocante a relações com o mundo invisível. O que vale muito para o homem apegado ao mundo terreno, para os Espíritos nada vale, e vice-versa. Essa diversidade de valores impede a compreensão do problema. (N. do T.)
(10) Este problema de correção da escrita mediúnica provocou explicações de Kardec na Revista Espírita, onde se pode encontrar o assunto mais desenvolvido. A correção permitida se refere apenas à forma: ortografia, questões de concordância ou sintaxe, pontuação e assim por diante. No tocante ao pensamento nada pode ser alterado, sob nenhum pretexto, a menos que o próprio Espírito comunicante ou um Espírito provadamente superior o autorize, o que só acontece excepcionalmente. (N. do T.)
(11) Note-se a precisão deste exemplo: o médium possui os elementos materiais da comunicação, que no caso são as moedas; o Espírito os toma e utiliza segundo as suas idéias, para exprimir o seu pensamento. Os exemplos anteriores são também de extrema clareza. Mas devemos ressaltar neste capítulo o perfeito esclarecimento das relações entre os Espíritos e os médiuns. Graças a esse esclarecimento, compreende-se a função mediúnica como de verdadeiro intérprete espiritual e os problemas tantas vezes levantados pela crítica, como o da marca pessoal do médium nas mensagens, o da trivialidade da maioria destas, o da dificuldade na obtenção de comunicações de teor elevado no campo das Ciências ou da Filosofia, e outros que tais ficam perfeitamente esclarecidos. Vê-se que os críticos do Espiritismo, em sua esmagadora maioria, nada conhecem de todos esses problemas, expostos de maneira precisa e didática há mais de um século. (N. do T.)
(12) Observe-se aqui a origem de uma das maiores dificuldades encontradas pela pesquisa psíquica. A lei de afinidade fluídica é desconsiderada pelos pesquisadores, em nome da desconfiança “necessária” ao rigor científico. Felizmente, na atualidade, os estudos de Parapsicologia sobre as relações entre o experimentador e o sensitivo modificaram muito essa situação, dando razão à pesquisa espírita. Compreende-se, afinal, depois de muitas torturas físicas e morais impostas aos médiuns, que o problema exige condições psicológicas favoráveis. (N. do T.)
(13) Note-se a diferença entre ser fluídico e ser encarnado. O primeiro, como Espírito, possui conhecimentos e predicados que podem não se refletir no segundo. O ser encarnado é um condicionamento especial do ser fluídico para uma experiência terrena, com vistas aos objetivos dessa experiência. A personalidade total do homem está no Espírito na conjugação espírito-corpo, que constitui a sua forma de manifestação temporária e específica na Terra. (N. do T.)
(14) A expressão vestir os pensamentos com palavras corresponde precisamente ao princípio espírita da encarnação e da materialização. O pensamento, segundo a Lógica, é uma entidade abstrata, que existe realmente, mas como objeto lógico. Essa entidade se manifesta no plano material através dos elementos convencionados para traduzir idéias: a palavra, a letra, os sinais da mímica, telegráficos e outros. É a esses signos convencionais que os Espíritos recorrem para nos transmitir, através dos médiuns, os seus pensamentos, que então se encarnam ou se materializam na palavra,, n escrita, na tiptologia. Esse problema lógico, até a pouco encarado como de simples abstração mental, passou para o plano da realidade cientifica através das pesquisas parapsicológicas sobre telepatia. O pensamento não é hoje apenas um objeto lógico, sem realidade própria, uma espécie de epifenômeno produzido pelo cérebro (segregado pelo cérebro como o fígado segrega a bílis, segundo a conhecida expressão materialista) mas um objeto dotado de realidade cientificamente constada e cuja natureza extrafísica (segundo Rhine e sua escola) abre as portas das Ciências para um novo mundo, evidentemente o espiritual. Na Física moderna o problema é colocado em termos de antimatéria mas também já foi atingido e o físico nuclear Arthur Compton chegou mesmo a afirmar que “por trás da energia”, a que as pesquisas reduziram a própria matéria, existe algo mais, e que esse algo mais “parece ser pensamento”. Vemos assim a importância dessas explicações dos espíritos de Erasto e Timóteo, dadas há mais de um século e sistematicamente desprezadas e ridicularizadas pelos que negam e combatem o Espiritismo. (N. do T.)
(15) Por que os Espíritos se referiam ao cérebro e não à mente, nessas explicações, e Kardec segue a mesma linha nas suas observações? Porque estão explicando o processo de manifestações, que implica a materialização do pensamento. É claro que os elementos ou materiais a que aludem são abstratos, são conceitos, mas em forma de palavras. Atente-se para a explicação final de que se as palavras nos são necessárias para a percepção do pensamento, mesmo mental, e será fácil compreender que eles tratam das funções do cérebro, que é o instrumento material da mente. De fato, nas experiências telepáticas ficou demonstrado que a transmissão do pensamento se faz por meio de palavras, em virtude do nosso hábito de pensar em palavras. (N. do T.)
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